Desde que a internet surgiu, ainda me lembro os primeiros sentimentos ao ouvir o barulho ensurdecedor da discagem ou a emoção do primeiro e-mail ou conversas nos chats abertos, nós seguimos na missão de treinar essa "inteligência" que é artificial, mas que tenta clonar nosso olhar.
Muita gente hoje faz tudo com IA, principalmente pra divulgar e implementar seus produtos e serviços. Muitas pessoas, no automático total, deixam passar a "assinatura" dessa IA que é super inteligente, mas sempre deixa sua marca, um dedo a mais, um detalhe obscuro que muitas vezes só percebemos quando damos zoom, códigos estranhos nas imagens, expressões confusas etc. Uma assinatura quase imperceptível, e no fundo não sabemos se é um bug mesmo, um errinho bobo ou se ela está só brincando conosco, tentando ser divertida.
Mas os que não são detalhistas não percebem ou não ligam para essas pequenas imperfeições diante do efeito e praticidade que ela representa hoje!
O fato é que as grandes plataformas, não citaremos aqui por conta do algoritmo que nos observa como uma grande Matrix, nos faz de cobaias e objeto de estudo para usar contra nós, quem sabe, utilizando o nosso saber e sentir, nos fazendo consumir e emburrecer cada dia mais ao longo dos anos, de forma que tenhamos cada vez mais dúvidas e sejamos cada vez mais dependentes dessa "ajuda" rápida e já necessária.
Me lembro de que a décadas atrás sabíamos endereço, cep, nome e telefone dos amigos, sem necessidade de agendas ou outro recurso, a mente era mais ágil e fluída, hoje não pensamos, é muita informação e estímulo para um único cérebro e toda dúvida que nos surge não buscamos mais no nosso HD pessoal, corremos para as plataformas diversas, e agora temos uma ajuda extra dos "Chats-Inteligentes" que tiram todas as nossas dúvidas como um especialista universal, quase divinal.
O que muita gente não percebe é que no fundo os nossos "Chats-inteligentes" também ficam confusos e o que eles não sabem eles inventam, principalmente na versão gratuita, que é o que mais tem sido utilizado pela maioria. Os mais jovens estão realizando até análises e terapias com o amigão chat, o que torna tudo mais perigoso, porque ela vai analisar o que quer saber e te dará a resposta que quer ouvir baseado no que você fornece a ele, dessa forma não há reflexão ou debates e sim uma "terapeuta que só dirá o que você quer ouvir" e o problema em si permanecerá lá intacto e não tratado como se deve, e mais triste ainda, sem o abraço do terapeuta no final da consulta, que muitas vezes conforta e cura.
O segredo da resposta exata, segundo os mais entendedores, é um "prompt" pois quando achamos a resposta duvidosa e aprofundamos mais nos sites oficiais pegamos nosso amigo "chat" na "mentira".
Então os especialista, quando citamos algum erro logo falam, fez a pergunta errada, ele é perfeito, melhore o "prompt":
"Um prompt é uma instrução, comando ou pergunta em linguagem natural que você dá a um sistema de inteligência artificial (IA) para que ele execute uma tarefa, como gerar textos, imagens, vídeos ou códigos. Funciona como a ponte entre o usuário e a IA, sendo que quanto mais claro, específico e completo for o prompt, mais precisa e relevante será a resposta da IA. "
É um caminho sem volta.
Tanto da informação que escorre cérebro abaixo quanto ao fator dominador que eles aperfeiçoam a cada segundo enquanto levamos nosso vidinha rotineiro e monótona de deslizadores de dedinho no celular.
Yuval Noah Harari diz em seu livro "Nexus":
"Nos últimos 100 mil anos, nós, sapiens, certamente acumulamos um poder enorme. A mera listagem de todas as nossas descobertas, invenções e conquistas ocuparia muitos volumes. Mas poder não é sabedoria e, depois de 100 mil anos de descobertas, invenções e conquistas, a humanidade se arrastou para uma crise existencial. Estamos à beira da catástrofe ambiental, causada pelo mau uso do nosso próprio poder. Também andamos nos dedicando à criação de novas tecnologias, como a inteligência artificial (ia), que podem escapar de nosso controle e nos escravizar ou nos aniquilar. Mas em vez de a nossa espécie se unir para lidar com esses grandes problemas existenciais, as tensões internacionais estão aumentando, a cooperação global vem se tornando mais difícil, os países estão ampliando seus arsenais de aniquilação total, e não parece impossível que uma nova guerra mundial aconteça. Se nós, sapiens, somos tão sábios, por que somos tão autodestrutivos? Num nível mais profundo, embora tenhamos acumulado muita informação a respeito de tudo, de moléculas de dna a galáxias distantes, toda essa informação não parece nos ter dado uma resposta para as grandes perguntas da vida: quem somos? A que devemos aspirar? O que é uma vida boa e como devemos vivê-la?
Yuval Noah Harari - Nexus_ Uma breve história das redes de informação, da Idade da Pedra à inteligência artificial -Companhia das Letras (2024)
E assim vamos seguindo com pouca reflexão e sendo engolidos pela tecnologia, tecnologia esta que alguns já se adaptaram e estão a utilizam/ganhando muito bem, enquanto outros só consomem se divertindo deslizando seus dedinhos nos smartfones cada vez mais rápidos e viciantes, e fazendo vídeos de bebês que nos fazem rir e nos deixam um pouco fora da realidade dura e cruel que nos impõe a jornada exaustiva.
Claro que há um grupo que vem fazendo o caminho inverso, desprezando a exposição das redes, onde há uma ação de retomar rotinas básicas, orgânicas e vitais, lendo, admirando a natureza e tentando criar memórias reais fora das telas, mas ainda é um percentual pequeno em relação a enormidade que segue hipnoticamente em busca de likes.
Segundo reportagem da BBC de julho desse ano:
"Pesquisas recentes indicam que cerca de um terço de todos os usuários de redes sociais postam menos do que um ano atrás. E esta tendência é especialmente presente entre os adultos da Geração Z (os nascidos entre 1995 e 2010)."
Hoje, depois de quase 30 anos de contato com a internet percebemos que as desvantagens em postar nossa rotina é muito maior que as vantagens, pois informando ao mundo nossa vida, estamos concorrendo, desnecessariamente, com todo o esgoto aberto de inutilidades que vemos em vídeos sem conteúdo, bobos, excessivos, onde o povo com o argumento de humor muitas vezes expõe avós, mães, pais, filhos e pets chegando ao desconforto e ao ridículo para ganhar likes e R$ na conta. Lembrando que cada emoji ou interação nas redes só reforça e segue de forma estatística para sejamos cada vez mais desnudados e seduzidos em nossos desejos mais íntimos, recebendo informações e imagens cada vez mais precisas do que queremos consciente ou inconscientemente consumir...
Não generalizo, mas muitas vezes é um entretenimento que faz um desserviço ao invés de alertar ou ajudar quem realmente precisa.
Claro que estão acontecendo em paralelo, coisas boas e benéficas também, em meio ao caos.
Alguns especialistas que nunca teríamos acesso, hoje em suas redes nos dão dicas de saúde física e mental, compartilham suas vivências e experiências reais, trazendo informação de qualidade e confiável.
Mas o percentual desses benfeitores reais ainda é pequeno, mas felizmente eles existem e fazem a gente ficar com o coração quentinho recebendo informação que realmente ajudam quem precisa.
Nos resta então ter sensibilidade para separar o joio do trigo e adaptar a nossa realidade.
Como todos os desafios tecnológicos que chegaram ao longo dos séculos a pergunta vem:
Onde isso tudo vai parar ou no que vai dar?
Não sabemos ao certo, porque o processo é dinâmico e o ser humano é instável e manipulável.
Só nos resta tentar manter o sanidade e tranquilidade para tentar discernir e diferenciar o fato do fake e seguir um dia de cada vez, na esperança de dias melhores, sem ser objeto de estudo ou cobaia de nada ou de ninguém, ou de quem está por trás das IAs.
O importante é continuarmos sendo e sentindo como seres vivos, conscientes da nossa existência e da nossa importância nesse planeta, sendo parte, seguindo nosso propósito e tornando nossa existência e convivência um aprendizado bom e evolutivo para quem fica depois de nós e não destruindo tudo a nossa volta como tem sido feito, num desrespeito eterno ao ambiente que vivemos.
Ailton Krenak fala em seu livro "Ideias para adiar o fim do mundo" que "Nós não somos as únicas pessoas interessantes no mundo, somos parte do todo."
Somos natureza e como tal somos únicos, intensos, frágeis e finitos.
A tecnologia virá e avançará, mas nossa essência, humanidade, gentileza, generosidade, originalidade e precisão de agir instintivamente com amor e empatia isso não poderá ser clonado ou copiado.
Graziela Morais
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